Homenagem ao Paraninfo e convite de formatura

Nunca desistam dos seus sonhos

No segundo semestre de 2013, me foi dada a maior honra que poderia receber.

Uma turma de bravos e nobres escolheu a mim como seu paraninfo, apesar de ter tantas opções tão superiores e tão mais óbvias. E, por isso, sou infinitamente grato.

Abaixo segue o discurso proferido na noite da última sexta-feira, 07 de Fevereiro, em homenagem aos formandos do segundo semestre de 2013 do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Fumec. A versão final ficou um pouco mais curta do que eu pretendia. Esta, que aqui publico, é a “versão estendida”, sem cortes.

Senhoras e senhores; companheiros da mesa; professores; meus professores; formandos,

boa noite.

Dirijo-me a vocês hoje como colega, por duas razões. Primeiro, porque hoje vocês são reconhecidos pela sociedade como publicitários. Uma magnífica conquista, primeira de muitas, que deve ser celebrada. E, segundo, principalmente porque, sentados nesta mesa, estão os meus professores. Os nossos professores. Se estou aqui hoje, recebendo tal honraria num momento tão prematuro da minha trajetória, é graças aos ensinamentos e à convivência de todos eles. Ciente da honra, mas também da responsabilidade que isso representa, convido-os a fazer uma breve reflexão sobre publicidade e propaganda nos dias de hoje, e o que significa ser publicitário. Abro aspas para um texto que li recentemente.

“Hoje em dia parece que, para os profissionais de marketing e de propaganda, se tornou necessário impor um certo estilo de vida às pessoas, e presumir que este deveria ser o único estilo de vida dentro do qual as pessoas devem viver. E, de algum modo, nós passamos a acreditar nestas mentiras. De que todas os homens têm um físico incrível, uma autoconfiança inabalável e corpos brilhantes. Para reforçar estas ideias, as marcas continuam despejando as mesmas mentiras nas caras das pessoas. Agora, chega. Nós devemos lutar pelo lado bom das pessoas. Porque as pessoas reais não são um clichê da propaganda. Ficar a toa é ótimo. Estar de pé é ir em frente. A perfeição é uma mentira. Nós não temos que provar NADA.”

Fecho aspas. É assustador pensar na veracidade disso tudo. Mas é ainda mais assustador perceber que este trecho é proveniente de um anúncio de cerveja. Vários outros exemplos poderiam ter sido citados: a dona de casa, perfeitamente maquiada, que sequer despenteia o cabelo ao cuidar do lar; ou as amigas, conversando no bar, todas magras, lindas e simétricas; ou a “família margarina”, que toma unida o seu farto café da manhã num dia ensolarado.

O publicitário tem um poder imensurável nas mãos. Inclusive o de jogar o próprio feitiço contra si, fazendo chacota das próprias ferramentas que usa para o convencimento dos outros. Afinal, se isso significar vender mais cervejas no fim das contas, que se dane. Vale tudo. 

E vocês, meus alunos, que tanto amadureceram durante o curso e que hoje se tornam profissionais aos olhos do resto do mundo, espero reencontrá-los pelos caminhos da profissão. Em agências, veículos, empresas. Na estreia do seu primeiro filme ou no lançamento do seu primeiro romance. E, neste dia, vocês serão melhores do que são hoje. Mas, para isso, é imprescindível que nunca deixem de refletir sobre o poder que têm nas mãos. Quando ainda estava na faculdade, inúmeras vezes me perguntei – porque diabos eu estava fazendo este curso? Eu jamais salvaria uma vida, como os médicos ou os bombeiros. Eu jamais colocaria um bandido atrás das grades, ou mesmo ajudaria a provar um inocente, como os advogados e promotores. Eu nem gostava tanto assim de propaganda! O que sempre gostei foi de desenhar. Que bem eu poderia fazer para este mundo sendo um reles “publicitário”? Para existir, o capitalismo depende da publicidade de maneira vital. Mas a ganância, que anda junto com este sistema, pode levar os publicitários e seu assombroso poder de persuasão, a mentir e a enganar. A importância da venda do produto, da marca, do serviço, ou – talvez, o mais assustador de todos – da ideia, sobrepõe-se a todas as outras. Os números e os resultados tornam-se prioridade máxima.

Mas, assim como o consumismo excessivo que desencadeou a crise econômica global de 2008, cada gordinho ou gordinha que sofre bullying na escola porque não se encaixa nos padrões; cada garota adolescente que sofre com a bulimia e os antidepressivos precocemente porque não consegue ver beleza em si mesma; cada pai de família que se endivida para comprar um automóvel financiado que não poderia; cada mulher que compra mais sapatos do que seria capaz de usar e tantos outros bilhões de exemplos que eu poderia citar aqui são responsabilidade nossa. A construção de um mundo em que “ter” e “parecer” são mais importantes do que ser de fato é responsabilidade nossa.

Por outro lado, quando as pessoas precisam entender corretamente uma ideia, ou mesmo, saber mais sobre o funcionamento de um produto ou conhecer melhor os candidatos da próxima eleição, a publicidade tem muitos méritos. Quando leva, por exemplo, informação às pessoas, ou um produto que vai facilitar o seu dia-a-dia. Quando um pequeno empresário ou empreendedor consegue prosperar, produzir e gerar empregos porque seu produto foi levado ao conhecimento do consumidor; ou quando um filho toma coragem para telefonar ao pai que há anos não via após se emocionar com um comercial de suco – nós somos os responsáveis.

O assombroso poder da comunicação – que, agora, pertence também a vocês, com o domínio de todas as ferramentas disponíveis – pode levar a trilhar dois caminhos: Um é o da propagação do que há de errado neste mundo, por meio da manipulação das pessoas que confiam em nós. O outro é o belo caminho, do qual podemos nos orgulhar por transformar a vida das pessoas. Nos orgulhar de ser publicitários. Entretanto, é tênue a linha que separa estes dois caminhos e, por isso, por vezes erraremos em nossas escolhas. Mas, se formos fiéis aos nossos ideais, àquilo que nossos pais e mestres nos ensinaram, sempre poderemos dormir tranquilos. Parafraseando Mark Waid, um artista que muito admiro: “a qualidade do seu trabalho é o que importa no final”. E eu digo que a qualidade só poderá ser tão grande quanto a sua honestidadePorque, no final da caminhada, ninguém vai se importar se o anúncio é ruim porque o cliente pediu para “mudar a cor”. Ou se a mídia foi fraca porque o cliente “acha que internet não funciona”. Todos só vão se importar com o trabalho que tiver sido feito, e se ele for medíocre, vocês é que serão associados à ele. Por isso, assegurem-se de que todo o trabalho que vocês fizerem seja sempre o seu melhor. E a vocês, que vi amadurecer tanto em um espaço de tempo tão curto, que mostraram inúmeras vezes do que são capazes; a vocês, meus caros, não é permitido exercer a mediocridade. Fazer um trabalho abaixo do seu potencial é uma forma de corrupção, não menos execrável do que a que tanto criticamos em nossos políticos.

Lembrem-se disso: vocês podem enganar os seus professores, os seus chefes, os seus clientes. Até mesmo os seus pais. Vocês têm poder para isso. Mas existe uma pessoa com a qual vocês jamais serão capazes de ser desonestos. E esta pessoa olha nos seus olhos todos os dias de manhã, pelo outro lado do espelho. E não é possível dormir à noite quando você tenta enganá-la.

Por isso, meus colegas publicitários, continuem honestos e fiéis, sobretudo consigo. “A qualidade do trabalho é o que importa no final”, e ela deve ser protegida a todo custo. Se for preciso, digam “não”. Recusem trabalhos que estejam em desacordo com os seus ideais e as suas crenças. Recusem vagas e projetos, mesmo que pareçam tentadores ou lucrativos.

Nem mesmo todo o dinheiro do mundo bastará para comprar os seus sonhos. Vendam ideias, conceitos e produtos e participem de projetos nos quais vocês acreditem. Mas não vendam suas almas. Não vendam seus sonhos. Jamais abram mão deles. Vocês podem – e devem – errar e acertar, mas façam isso por princípios nos quais vocês acreditam pura e verdadeiramente. Não se deixem convencer pelos elogios que receberem. Sejam eternos insatisfeitos e curiosos. Aprendam e melhorem a cada dia. Assim, e somente assim, seremos publicitários. Com orgulho. Hoje e sempre.

Obrigado.

Obrigado, formandos do segundo semestre do dano de 2013 da Universidade Fumec. Vocês marcaram minha vida de um modo inesquecível.

Vocês já são publicitários desde o momento em que escolheram trilhar este caminho. Parabéns a todos!

Até.

About Dan Aroeira

Criador do Samurai Boy, coautor de Mandinga e Alynna. Ilustrador profissional, diretor de arte e professor de artes visuais na PUC-MG e na Universidade Fumec.
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Creator of Samurai Boy, co-author of Mandinga and Alynna. Professional illustrator, art director and visual arts professor at PUC-MG and Fumec University.

3 Comments

  1. Oi Prof,
    Boa tarde!

    Depois de um ano, vim aqui ler de novo tudo que você falou pra gente e cada vez que leio vejo como tudo faz sentido.
    Vim aqui só te agradecer mais uma vez pelas palavras e ensinamentos durante a caminhada que funcionam e marcam até hoje!
    Beijo, Letícia!

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